A recente aprovação pelo Senado italiano da conversão em lei do decreto nº 36/2025 trouxe mudanças drásticas na obtenção da cidadania italiana por descendência (ius sanguinis).
A lei impõe restrições significativas, consideradas por muitos juristas como claramente inconstitucionais. Mas como exatamente cidadãos e entidades podem contestar essa lei? Conheça os caminhos possíveis e especialmente uma via rara, porém poderosa: o recurso direto via presidentes das regiões italianas.
As Duas Formas de Contestação
Existem dois caminhos principais para levar a questão à Corte Constitucional italiana:
1. Via Incidental (Comum e acessível a todos os cidadãos)
Este método é o mais acessível e frequentemente usado. Funciona da seguinte forma:
- O cidadão prejudicado ajuíza uma ação judicial comum (administrativa ou civil) contra a negativa do reconhecimento de cidadania baseada nessa nova lei.
- Durante o julgamento, se o juiz italiano considerar procedente a questão de constitucionalidade apresentada, ele mesmo poderá remeter o caso diretamente à Corte Constitucional.
- Este é um caminho amplamente utilizado, mas pode levar alguns anos, dependendo da carga judicial.
2. Recurso Direto na Corte Constitucional (Raro e Restrito)
Este recurso, conhecido como “ricorso diretto in via principale”, é extremamente restrito, sendo uma prerrogativa exclusiva de autoridades institucionais, principalmente dos presidentes das regiões italianas.
Esses presidentes regionais (ou governadores) têm legitimidade ativa para contestar diretamente leis nacionais, desde que demonstrem que a nova legislação invade competências regionais ou causa dano direto aos interesses de sua região.
Quais Regiões Poderiam Agir Diretamente?
Entre as 20 regiões italianas, algumas se destacam pela forte conexão com comunidades de emigrantes e descendentes italianos no exterior. Essas regiões têm interesse legítimo em contestar diretamente a lei devido ao impacto em áreas como turismo de retorno, relações econômicas, culturais e históricas com as comunidades italianas no mundo.
Entre as regiões com maior probabilidade de ação direta estão:
- Vêneto e Friuli-Venezia Giulia (governadas pela Lega).
- Sicília e Calábria (governadas por Forza Italia).
- Campânia (governada pelo Partido Democrático).
A probabilidade dessas regiões atuarem diretamente contra a lei depende também do contexto político. Governos regionais ligados diretamente à coalizão nacional (como Fratelli d’Italia, partido da atual primeira-ministra Giorgia Meloni) podem enfrentar resistência política interna. Por outro lado, regiões governadas por partidos da oposição ou independentes tendem a ter mais liberdade política para agir diretamente.
Importância do Recurso Direto
O recurso direto das regiões é significativo porque:
- Permite levar rapidamente a questão constitucional à Corte, acelerando uma possível revogação da lei.
- Representa um forte posicionamento político e jurídico, chamando atenção nacional e internacional para a questão.
Conclusão: Mobilização e Estratégia
Embora o caminho judicial indireto (via incidental) permaneça acessível a todos, uma mobilização política e popular para sensibilizar presidentes regionais pode ser fundamental para uma rápida revisão constitucional dessa lei.
Considerando o profundo impacto dessa legislação sobre milhões de descendentes de italianos pelo mundo, uma ação direta de uma região italiana pode tornar-se um divisor de águas nessa discussão, abrindo uma frente decisiva para garantir a manutenção dos direitos históricos ligados à cidadania italiana.